Por meio do diretor da Sala de Imprensa, Mateo Bruni, a Santa Sé comunicou neste sábado, 31 de janeiro, o falecimento do Papa Emérito Bento XVI, às 9h30 (horário do Vaticano).
“Com pesar informo que o Papa Emérito Bento XVI faleceu hoje às 9,34, no Mosteiro Mater Ecclesiae, no Vaticano. Assim que possível, serão enviadas novas informações”, diz o comunicado.
De acordo com o arcebispo de Belo Horizonte e presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Walmor Oliveira de Azevedo, a vida de Bento XVI transmite lições essenciais para a Igreja e o mundo.
“Homem de uma fé inabalável, profunda, que o sustentou em cada etapa de sua notável trajetória neste mundo. Sua mente brilhante, de lucidez destacada, o fez referência intelectual, com muitos artigos e livros publicados, contribuindo para o conhecimento mais aprofundado sobre os mistérios da fé. Líder, acolheu a nomeação para ser bispo e, depois, cardeal”, disse.
Dom Walmor recordou que o Papa Emérito esteve à frente do Dicastério para a Doutrina da Fé, por muitos anos, servindo como guardião zeloso do magistério da Igreja. Um tempo em que sempre esteve ao lado de São João Paulo II. Depois, eleito seu sucessor, venceu limites físicos impostos pela idade com notável vigor espiritual e intelectual, inspirando caminhos novos para a Igreja.
O presidente da CNBB recordou também dos encontros que teve com Bento XVI: “Tive a oportunidade de encontrá-lo em diferentes ocasiões. Nomeado por Bento XVI para auxiliar a Igreja no Dicastério para a Doutrina da Fé, agradeço a Deus pela preciosa oportunidade. Além dos momentos em Roma, estivemos juntos na Conferência de Aparecida, acontecimento marcante da Igreja na América Latina realizado em 2007. Guardo no coração o seu jeito simples, mesmo com tantos dons e virtudes”.
Outro destaque de dom Walmor foi quanto à renúncia do Papa Emérito. “A sua renúncia ao pontificado, que surpreende um mundo onde muitos se apegam a cargos e ao poder, foi uma lição. Recolhido em retiro, discreto, sempre expressou a sua unidade com o pontificado do Papa Francisco. A Igreja e o mundo se despedem de uma mente brilhante, de um servidor notável, líder inscrito na história, que testemunhou até o fim a simplicidade, fiel ao Evangelho. O próprio Bento XVI assim se definia: ‘Um simples operário da vinha do Senhor’. Gratidão a Deus pela vida do Papa Emérito Bento XVI”.
Biografia e trajetória
Eleito o 265º Papa da Igreja Católica, exercendo o ministério petrino entre 2005 e 2013, Joseph Ratzinger nasceu em Marktl am Inn, no território da diocese de Passau (Alemanha), em 16 de abril de 1927. Seu pai era um comissário de polícia e provinha de uma família de agricultores da Baixa Baviera. A mãe era filha de artesãos de Rimsting, no lago de Chiem, e antes de casar tinha trabalhado como cozinheira em vários hotéis. Transcorreu a sua infância e a sua adolescência em Traunstein, uma pequena cidade perto da fronteira com a Áustria. Recebeu neste contexto, que ele mesmo definiu “mozartiano”, a sua formação cristã, humana e cultural.
O tempo da sua juventude não foi fácil. A fé e a educação da sua família preparou-o para a dura experiência dos problemas relacionados com o regime nazista: ele recordou ter visto o seu pároco açoitado pelos nazistas antes da celebração da Santa Missa e de ter conhecido o clima de grande hostilidade em relação à Igreja católica na Alemanha. Quase no final da Segunda Guerra Mundial, também foi alistado nos serviços auxiliares antiaéreos.
Formação sacerdotal
De 1946 a 1951 estudou filosofia e teologia na Escola superior de filosofia e teologia de Frisinga e na Universidade de Munique. Em 29 de Junho de 1951 foi ordenado sacerdote. Um ano mais tarde, Pe. Joseph Ratzinger iniciou a sua atuação como professor na mesma Escola de Frisinga, onde tinha sido estudante.
Em 1953, formou-se em teologia com uma dissertação sobre o tema “Povo e Casa de Deus na Doutrina da Igreja de Santo Agostinho”. Em 1957 fez a livre docência com o conhecido professor de teologia fundamental de Munique, Gottlieb Söhngen, com um trabalho sobre “A teologia da história de São Boaventura”.
Até o início da década de 1970, acumulou experiências como docente. Também foi vice-reitor da Universidade de Ratisbona. A sua intensa atividade científica levou-o a desempenhar importantes cargos no âmbito da Conferência Episcopal Alemã, na Comissão Teológica Internacional.
A série numerosa de publicações continuou abundante e pontual ao longo dos anos, constituindo um ponto de referência para tantas pessoas e sobretudo para quantos estão comprometidos no estudo aprofundado da teologia. De grande valor, central na vida do Pastor Ratzinger, foi a experiência proveitosa da sua participação no Concílio Vaticano II como perito.
Nomeação como bispo
No dia 25 de março de 1977, o Papa Paulo VI nomeou-o arcebispo de Munique e Frisinga, na Alamanha. Recebeu a ordenação episcopal no dia 28 de maio do mesmo ano: foi o primeiro sacerdote diocesano que assumiu, depois de oitenta anos, o governo pastoral da grande diocese da Baviera. Escolheu como mote episcopal “Colaboradores da Verdade”. O mesmo Papa Montini criou-o e publicou-o cardeal, do Título de Santa Maria Consoladora no Tiburtino, no Consistório de 27 de junho de 1977.
Bento XVI foi relator na V Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos (1980) sobre o tema da Família cristã no mundo contemporâneo. Foi presidente delegado da Sexta Assembleia (1983) que teve por tema a reconciliação e a penitência na missão da Igreja.
A 25 de novembro de 1981, João Paulo II nomeou-o prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé. Foi também presidente da Pontifícia Comissão Bíblica e da Comissão Teológica Internacional. A 15 de fevereiro de 1982 renunciou ao governo pastoral da arquidiocese de Munique e Frisinga.
O cardeal Ratzinger também presidiu a Comissão para a Preparação do Catecismo da Igreja Católica. A 5 de abril de 1993, foi chamado a fazer parte da Ordem dos Bispos e tomou posse do Título da Igreja Suburbicária de Velletri-Segni. No dia 6 de novembro de 1998, foi nomeado Vice-Decano do Colégio Cardinalício e a 30 de novembro de 2002 tornou-se Decano: tomou posse do Título da Igreja Suburbicária de Ostia.
Até à eleição para a Cátedra de Pedro, foi membro do Conselho da II Sessão da Secretaria de Estado; das Congregações para as Igrejas Orientais, do Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, para os Bispos, para a Evangelização, para a Educação Católica; do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos; da Pontifícia Comissão para a América Latina e da Pontifícia Comissão “Ecclesia Dei”.
Fidelidade ao então Papa João Paulo II
No dia 8 de abril de 2005, ele como decano do Colégio Cardinalício presidiu à Santa Missa das exéquias de João Paulo II, na Praça de São Pedro. A sua homilia expressou a grande fidelidade ao Papa e à sua própria missão.
“”Segue-me”, diz o Senhor ressuscitado a Pedro, como sua última palavra a este discípulo, escolhido para apascentar as suas ovelhas. “Segue-me” esta palavra lapidária de Cristo pode ser considerada a chave para compreender a mensagem que vem da vida do nosso amado Papa João Paulo II, cujos despojos mortais depomos hoje na terra como semente de imortalidade o coração cheio de tristeza, mas também de jubilosa esperança e de profunda gratidão”.
Dias depois, em 19 de abril, foi eleito Papa, tendo iniciado o pontificado no dia 24 daquele mês.
Cartas, exortações e encíclicas
No seu pontificado, Bento publicou, além de quatro exortações apostólicas – “Ecclesia in Medio Oriente”, “Africae múnus”, “Verbum Domini” e “Sacramentum Caritatis” –, além das cartas apostólicas, constituições apostólicas e três encíclicas: “Deus caritas est”, “Spe salvi” e “Caritas in veritate”.
Na primeira, recorda que “‘Deus é amor, e quem permanece no amor permanece em Deus e Deus nele’ (1 Jo 4, 16). Estas palavras da I Carta de João exprimem, com singular clareza, o centro da fé cristã: a imagem cristã de Deus e também a consequente imagem do homem e do seu caminho. Além disso, no mesmo versículo, João oferece-nos, por assim dizer, uma fórmula sintética da existência cristã: ‘Nós conhecemos e cremos no amor que Deus nos tem’ […]. Num mundo em que ao nome de Deus se associa às vezes a vingança ou mesmo o dever do ódio e da violência, esta é uma mensagem de grande atualidade e de significado muito concreto” (n. 1).
Na segunda lembra, a partir de Rm 8,24, que é na esperança que fomos salvos. “A ‘redenção’, a salvação, segundo a fé cristã, não é um simples dado de fato. A redenção é-nos oferecida no sentido que nos foi dada a esperança, uma esperança fidedigna, graças à qual podemos enfrentar o nosso tempo presente: o presente, ainda que custoso, pode ser vivido e aceite, se levar a uma meta e se pudermos estar seguros desta meta, se esta meta for tão grande que justifique a canseira do caminho” (n. 1). Já na terceira e última encíclica do seu pontificado, Bento XVI se volta para a Doutrina Social da Igreja com a Caritas in veritate. Aí o Papa constata, de modo muito oportuno, que “a caridade é amor recebido e dado; é ‘graça’ (cháris). A sua nascente é o amor fontal do Pai pelo Filho no Espírito Santo. É amor que, pelo Filho, desce sobre nós. É amor criador, pelo qual existimos; amor redentor, pelo qual somos recriados. Amor revelado e vivido por Cristo (cf. Jo 13,1), é ‘derramado em nossos corações pelo Espírito Santo’ (Rm 5,5). Destinatários do amor de Deus, os homens são constituídos sujeitos de caridade, chamados a fazerem-se eles mesmos instrumentos da graça, para difundir a caridade de Deus e tecer redes de caridade” (n. 4).
Viagens apostólicas
Segundo informações do professor Fernando Altemeyer Junior, do departamento de Ciência da Religião da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Bento XVI foi o sagrante principal da ordenação de 26 bispos. Como Papa, realizou 29 viagens dentro da Itália e 24 viagens internacionais estando em 23 países, uma delas no Brasil, em 2007. Na ocasião, quando visitou o Brasil, em maio daquele ano, participou da V Conferência do Episcopado Latino Americano e Caribenho, em Aparecida.
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