UM CONVITE À REFLEXÃO.
CANAL EXTRAVASOR OU BACIAS DE CONTENÇÃO: ALGUÉM SE LEMBRA DESSE DEBATE?
Hoje (11/03) o face me trouxe a lembrança mais um 11 de março. Lembro da madrugada do dia 10 para 11 de março de 2011, quando sem nenhum aviso prévio ou precedente histórico nosso Município de São Lourenço do Sul foi atingido por um fenômeno climático atípico advindo da enxurrada brusca provocada por chuvas intensas, aproximadamente 600 milímetros caíram em menos de 24 horas na bacia do Rio São Lourenço. As causas e consequências dessa calamidade pública foram superadas pela resiliência e esforço de muitos que serviram de energia na busca de recursos que possibilitaram a construção de casas, contenção das margens do arroio, construção de 23 pontes concreto, calçamentos, recuperação e revitalização da praia da barrinha.
No entanto essa mesma lembrança me trouxe uma reflexão que gostaria de compartilhar com os amigos. Há duas semanas atrás, antes da guerra Rússia - Ucrânia, as manchetes dos grandes telejornais brasileiros e internacionais divulgavam com espanto as mortes e destruição provocadas no Município de Petrópolis, Estado do Rio de Janeiro causada pelo grande deslizamento de lama advindo dos morros que derreteram após serem impactados por chuvas intensas em volumes acima de 300 mm.
Lembrei, vendo aquela reportagem do programa Fantástico da Rede Globo, que noticiou a tragédia na cidade fluminense, que há exatos 11 anos atrás estive com aquelas mesmas pessoas que foram entrevistadas como o ex Prefeito, Diretores e Técnicos do Cemadem, Inpe, entre outros representantes de órgãos entrevistados.
Estive com aquelas pessoas em Brasília porque eles haviam sido atingidos por um fenômeno climático igual ao que ocorreu agora recentemente. Naquela oportunidade o evento atingiu a serra carioca no final de mês de fevereiro de 2011. Nós fomos atingidos na madrugada de 10 para 11 de março.
Na peregrinação que fizemos juntos com o Prefeito de Petrópolis ao Ministério da Integração Nacional, Ministério da Fazenda, Ministério das Cidades e Secretaria Nacional de Defesa Civil, bem como há diversos órgãos de pesquisa na busca do diagnóstico do fenômeno e recursos à recuperação da infraestrutura dos Municípios, técnicos do INPE – Instituto Nacional Pesquisas Espaciais nos diziam que esse fenômeno deveria voltar a ocorrer novamente em 100 anos.
Pois bem, ocorreu somente após 11 anos na cidade de Petrópolis no RJ e de forma muito mais intensa. O clima começa a dar sinais de que também anda estressado.
Os amigos devem estar se perguntando: O que a situação de Petrópolis tem haver com São Lourenço do Sul/RS. Tudo! Um sinal de que poderá voltar a ocorrer em período inferior a 100 anos em nosso Município.
Pois bem. Independente de questões políticas quero aqui manifestar uma preocupação com a inércia da atual Administração Municipal quanto a medidas de mitigação a eventual catástrofe semelhante ao março de 2011. Com um detalhe, agora já sabemos que o fenômeno pode ocorrer com uma grande intensidade de chuvas na bacia do Rio São Lourenço e os estragos que pode ocasionar a estrutura e a vida das pessoas.
Lamento profundamente que a atual Administração Municipal, desde que saímos do Administração do Município, não tenha promovido nenhum estudo, ou dado continuidade aos estudos de projetos que possam evitar ou mitigar os efeitos de eventual enxurrada semelhante a de março 2011. Bom lembrar que a cidade de São Lourenço do Sul situa-se no caminho das águas advindas da serra dos tapes. Nossa geografia aponta o ponto mais alto a 370 metros do nível do mar e a cidade no nível 0 em relação ao mesmo referencial.
Não me refiro as pequenas cheias do Rio São Lourenço que não causam grandes estragos e possibilitam a salvaguarda da vida das pessoas. Para essas, a dragagem do Arroio ajudariam a evitar o extravasamento das águas. No entanto, essa mesma dragagem, conforme estudos realizados pelo INPE e Convênio com a Faculdade de Engenharia da Universidade de Pelotas – UFPEL, bem como técnicos de outros órgãos, eram unânimes que essas dragagens somente dentro da cidade poderiam aumentar a potencialidade de dano na hipótese de enxurrada.
Esses debates foram feitos em vários momentos na nossa cidade com a participação da população quando se debatiam com técnicos a melhor solução para evitar ou mitigar as consequências de uma enxurrada brusca.
Na oportunidade os debates se concentraram na solução pela construção de um Canal Extravasor ou Bacias de Contenção. Quem lembra disso???
Após intensos debates com engenheiros da UFPEL e outros centros de pesquisa e técnicos de São Lourenço do Sul a conclusão foi de que a melhor concepção seriam as lagoas de contenção, isto é, três grandes lagoas (açudes secos) ao longo do curso do Rio São Lourenço cada um com bacia aproximada de 10 hectares distribuídos em pontos demarcados com barreiras de contenção que forçariam o excesso de água a adentrar nas bacias e por vertedouros dariam vazão lenta ao curso das águas de forma que o excesso de volume chegaria a cidade em volume e velocidade menores dando conta do Rio dar vazão às águas para a Laguna dos Patos.
Todos os engenheiros e técnicos eram unânimes que se fizesse dragagem apenas dentro da cidade (como estava sendo feito) seriam como se uma bacia de contenção fosse feita dentro da cidade chamando por consequência um maior volume e velocidade de águas para dentro da cidade, além de enorme desperdício de recursos públicos na medida em que sem desassorear a nascente do Rio e recompor a mata ciliar, nada adiantaria, pois um volume maior de areia seria carreado para dentro do próprio Rio São Lourenço com a vazão da descida das águas.
O que me causa espanto é que a atual Administração Municipal não tenha dado continuidade aos estudos, projetos e captação de recursos à execução de obras estruturais de suma importância ao Município de São Lourenço do Sul embora tenha feito aprovar na Câmara Municipal a Lei nº 3.873, de 20 de dezembro de 2018, para aprovação à contratar Financiamento no valor de R$ 13.500.000,00, junto ao FINISA – Programa de Financiamento à Infraestrutura e ao Saneamento do Governo Federal contratado junto a CEF – Caixa Econômica Federal.
O art. 5º, da referida Lei Municipal nº 3.873/2018, estipulava que os recursos deveriam ser utilizados prioritariamente na aquisição de draga, realização de estudos, elaboração de projeto técnico e execução de obras necessárias de engenharia para desassoreamento e controle de vazão do Rio São Lourenço.
O inciso I, do art. 5º da Lei Municipal nº 3.873/2018, estipulava ainda que licitada e contratada a empresa para execução da etapa descrita no art. 5º, ficava o Poder Executivo autorizado a utilizar o restante da operação de crédito nas demais etapas previstas na carta consulta.
O que causa preocupação é que em resposta a pedido de informação formulada pelo Vereador Luis Weber, o Poder Executivo informa que a meta de “dessassoriação” (termo não é meu) do Arroio São Lourenço foi dispensada do FINISA por orientação da equipe técnica da Regov/Caixa, visto que o Município já viria executando esta obra através do Convênio 1109/2020 – SUPRG.
Como registrei, o debate dos engenheiros e técnicos à época diziam que essa dragagem de limpeza de desassoreamento e não “dessassoriação”, com o devido respeito, não resolvem eventuais consequências de uma enxurrada, podem até agravar a situação.
Na mesma resposta ao pedido de informação o Poder Executivo informa que o valor total dos recursos onerosos por financiamento via Programa de Saneamento FINISA no valor total de R$ 13.500.000,00, foi distribuído nas metas definidas pelas secretarias.
O que me preocupa é que a atual Administração Municipal, que alardeava ter recebido o Município com dividas de 38 milhões de reais, tenha aprovado e contratado dois financiamentos, um no valor de R$ 13.500.000,00 (Lei nº 3.873/2018) e outro de R$ 4.800.000,00 (Lei nº 4043/2021), ou seja, um total de R$ 18.300.000,00, e nenhum centavo tenha sido destinado à continuidade dos estudos, projetos de concepção e execução de obras à prevenção e mitigação dos efeitos de uma enxurrada semelhante a de 2011, embora a Lei Municipal nº 3.873/2018, fizesse previsão expressa para uso dos recursos de financiamento.
Não estou criticando as ciclovias que estão sendo feitas na praia, ou os calçamentos e asfaltos que serão feitos, nem os caminhões caçambas adquiridos, mas sim, que ao meu ver deveriam ser dados continuidade aos estudos e projetos de concepção às obras estruturais que podem evitar uma tragédia semelhante a 2011.
Em Petrópolis levaria 100 anos, levou 11 anos. E aqui, o que faremos?
Por:
José Daniel Raupp Martins
Advogado
Ex-prefeito de São Lourenço do Sul - 2013-2016
Vice-prefeito de São Lourenço do Sul - 2005-2008